Ainda o Zé Dirceu
Deputados e senadores mandam avisar: "Vamos ficar de mau dos Ministros do Supremo se eles não deixarem a gente caçar o Dirceu."
Nesta quinta feira, vários parlamentares se reuniram para, num ato conjunto de repúdio, fazer beicinho, bater com os pezinhos no chão e, assim, deixar claro que não concordam com o STF. Expondo de maneira clara e madura suas razões, disseram que não irão votar o Orçamento da União - simplesmente a lei mais importante do ano -, enquando não puderem caçar o Dirceu em paz.
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Brincadeiras de lado, já discuti esse tema. Por favor, leiam. Mas, a imaturidade e fragilidade intelectual dos nossos representantes, não cansa de me assustar. Agora eles disseram que não precisam seguir "o devido processo legal" e que "os princípios do direito não se aplicam a eles". Vão até mandar uma cópia do Regulamento Interno do Conselho de Ética para o Supremo, só pra mostrar que fizeram tudo direitinho. Ai ai...
Primeiro, dizer que não precisam seguir o devido processo legal, nem se submeter aos princípios do direito é - no mínimo - uma proclamação de divindade. É dizer que estão acima de todas as Leis e, principalmente, da Constituição, que resguarda estes princípios.
Segundo, recorrer a "regulamentos internos" é patético! Será que nossos representantes - logo eles que são incumbidos de fazer leis -, não conhecem a hierarquia delas?! Não sabem que regulamentos internos, fazendo parte da categoria dos atos administrativos, são as mais fraquinhas das normas, e que se submetem à todas as demais Leis?
Por fim, não param de falar que ninguém teve mais "direito à ampla defesa" do que Dirceu. Não entendem como a Justiça pode pensar que houve cerceamento de defesa. A esse coro junta-se a imprensa... Sempre ela.
Só pra esclarecer, direito de ampla defesa não é dar mil entrevistas falando o que quiser. Ampla defesa é todo um conjunto de regras estabelecidas, cujo objetivo é garantir todas as oportunidades de defesa dentro de um processo. Entre essas regras, tem-se que a defesa fica sempre com a última palavra (justamente um dos pontos questionados por Dirceu). Ou seja, as testemunhas de acusação são ouvidas antes das de defesa e, da mesma forma, a acusação sempre se pronuncia antes da defesa.
Por quê? Ué, porque primeiro você acusa, depois eu me defendo, oras! A acusação não pode ter a última palavra, deixando, assim, pontos sem oportunidade de defesa. Nem dá pra querer que o sujeito se defenda primeiro pra depois eu acusar livremente, senão o processo fica manipulado.
Sei que, falando assim, vocês até podem pensar que estou defendendo o Dirceu. Não é isso. Inclusive, como todos, eu também acho que ele tem culpa no cartório, só não conseguiram provar satisfatoriamente.
Agora, o que defendo sempre é a justiça, são os princípios do direito e as garantias fundamentais - regras que transformam uma horda em sociedade civilizada. O caso Dirceu tem apenas repetido erros que não são exclusivos do Congresso, mas que me causam verdadeira aflição como advogado. Daí minha incapacidade de ficar calado.
Se eu tiver paciência para voltar a esse assunto - não prometo nada -, falarei um pouquinho sobre processo político para vocês.
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Update
Estão alegando que o regulamento do Conselho de Ética não prevê diferenciação entre testemunhas de acusação ou defesa. Eu não tinha pensado nisso, mas tanto pior. Não invalida nenhuma das minhas colocações. Aí que o direito de ampla defesa foi pras cucuias mesmo, pois só haveriam testemunhas convocadas pelo conselho. - Nenhuma testemunha convocada pela defesa. - O que torna o processo inquisitório. Dá pra ver como esse regulamento foi bem elaborado...
1 Comments:
A meu regulamento é bem mais simples.. os direitos humanos não gosta muito, mas não tem essa enrolação toda.
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