terça-feira, março 14, 2006

Não ia postar isto, mas... Vá lá

Quando eu era garoto, assim como toda criança, eu tinha o poder de me maravilhar com o mundo. Histórias e estórias, ciência e mito, verdades e mentiras, tudo me fascinava. Também o mundo sensorial, apesar de ter sido injustamente desprestigiado em minha vida, tinha suas belezas e prazeres a oferecer: sabores, sons, imagens, cheiros, temperaturas e relevos. Observar um inseto ou uma planta poderia ser incrível. Sentir o vento ou ver a luz do sol poderia ser fabuloso. A vida, em seu estado bruto, puro e irracional fluía dentro de mim.

Mas, em algum lugar, tudo isso se perdeu.

Confesso que a percepção do fim da infância e, infelizmente, junto com ela, da capacidade de me maravilhar, foi algo estranho. Primeiro meus sentidos foram entorpecidos e suas mensagens não eram mais fontes de prazer, espanto ou dor. Nublado esse prazer primário, instintivo e físico, restava o prazer intelectual, meu mundo interno. E assim vivi por algum tempo.

Mas aquele era o início da adolescência e, mesmo tendo perdido o entusiasmo infantil, eu estava disposto a recuperar meus sentidos. Ah, quando se é adolescente o mundo real tem muito a oferecer! Você descobre poderes escondidos em seu corpo. Descobre que pode nadar, correr e saltar como nunca havia imaginado ser capaz. Descobre que o mundo se divide entre nós e eles. Que sua turma é a melhor do colégio, reunindo os mais inteligentes e os mais fortes. Descobre que pode ter todas as garotas do mundo, embora falte coragem para ter pelo menos uma. Acredita que tem algo grande e importante a realizar, mesmo sem saber exatamente o que é.

Só que a adolescência também se vai. É curta, mais curta que a infância. São apenas quatro ou cinco anos de loucura, até que você descobre que o colégio terminou e existe um tal de vestibular. Os amigos se separam, as prioridades mudam, você muda. Foi mais ou menos nesse ponto que eu comecei a secar por dentro.

Não acredito em nada, não vejo magia em nada. Tanto quis escapar da dor, escolher o que sentir e quando sentir, que matei a fonte de todo sentimento: a espontaneidade. Sentimentos não podem ser manipulados sem que se pague um preço. Arrogar-se a onisciência sobre o que é melhor para si mesmo, sem conferir nenhum crédito ao acaso, talvez seja cobrar demais de uma mente tão limitada quanto a humana.

Falando assim, pode parecer que estou revoltado ou deprimido, o que não é verdade. Tristeza é um dos sentimentos que aprendi a manter distantes, pelo menos a maior parte do tempo. Eu só não esperava que esse controle também afastasse de mim a alegria. Não pensei que da mesma torneira que vêm os maus sentimentos, jorrassem os bons. Não esperava que fechá-la me fechasse para toda sensação.

Sabe qual é o meu mal? É estar sempre no controle. Lutei tanto para me encontrar e hoje tudo que desejo é me perder novamente. Estranho como foi preciso adquirir força e sabedoria para perceber que sempre tive tudo. Só não sabia aproveitar.

3 Comments:

Blogger wilson falchi said...

Acho que temos muito mais coisas em comum do que apenas ter começado a blogar na mesma época.

15/3/06 08:19  
Anonymous Anônimo said...

quase chorei. que triste. alex castro

15/3/06 19:30  
Blogger Jones said...

Olá,
Estou no período no qual me perco...
Por 17 anos em minha cidade natal, mesmo colégio, mesma roda de pessoas...agora o acaso me fez estudar em uma universidade em outra cidade, tudo mudou, tudo mudando.
Tem algum conselho? :)
Gostaria de um "feedback", se puder, é claro...

26/3/06 01:41  

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