Cheney e o Tiro
Na minha escala de valores, o tiro que Cheney deu no amigo mereceria, no máximo, duas linhas de jornal. E só mesmo porque os envolvidos são pessoas conhecidas. Bastava uma notinha assim: Cheney atira acidentalmente em seu amigo, o advogado Harry Whittington, durante caçada no Texas. A vítima foi socorrida e está hospitalizada. Viu? Assunto encerrado até que surjam novidades. Mas, claro, não é o que pensa a imprensa.
Antes que me chamem de bushista ou sei lá o quê, aviso logo que discordo de boa parte das políticas de Bush e, se eu fosse americano, não votaria nele. A mesma coisa digo de Cheney. (Triste ter que dar avisos como esse para que as pessoas pelo menos leiam o que você escreveu antes de atirar pedras.) Na verdade, o caso só me interessou por ser mais um exemplo de como imprensa e loucura coletiva se alimentam mutuamente.
Quando existe um ligação real ou pelo menos um nexo de causalidade, é natural que nos preocupemos com os outros. Só que, quando falamos de pessoas públicas, o que vemos é uma preocupação patológica com a vida alheia.
Pessoas que não conseguem compreender o mundo senão pelo prisma afetivo-pessoal, desenvolvem amores e ódios por gente que nem conhecem. Elas não são capazes de dissociar o público do particular, a obra do artista ou as idéias do pensador. Assim, passam a ter uma curiosidade infundada sobre a vida particular do outro, sendo emocionalmente afetadas pelo que ocorre com a personalidade em questão. A intensidade desse fenômeno vai apenas determinar se o sujeito é um idiota (a maioria), um desocupado carente ou até um perseguidor assassino.
Tomando o caso Cheney como exemplo, vemos que ele é um político. Ou seja, a única coisa que pode, com razão, despertar interesse nas pessoas, são suas idéias e ações político-administrativas. Mas não, as pessoas querem saber o que acontece quando ele não está trabalhando. Chegam a sentir um interesse mórbido em explorar um acidente. - Cobram! - que ele dê explicações para a imprensa. Pior, exigem explicações até da Casa Branca.
Ora, ninguém deve nenhuma explicação à imprensa ou ao povo sobre um evento como aquele. Cheney não tinha que chamar a imprensa, nem dar satisfações pra ninguém além da família da vítima. O fato dele ser um homem público não muda a natureza particular do evento. Da mesma forma que ninguém tem nada a ver com um acidente envolvendo um cidadão comum, ninguém tem nada a ver com um evento particular na vida de um homem público.
Ele só poderia ter sido recriminado se não tivesse prestado socorro à vítima (o que não ocorreu) ou por impedir o trabalho da polícia. Notem que falei em impedir, pois nem a comunicar o fato para a polícia ele é obrigado. Não conheço a lei do Texas, mas a obrigação de chamar a polícia nesses casos, nunca é dos envolvidos. Aliás, não se exige isso do cidadão. Apenas hospitais, bombeiros, et cetera, tem o dever funcional de comunicar à polícia acidentes com armas de fogo.
Dessa forma, além de curiosidade patológica e morbidez pura e simples, esses casos revelam a confusão que existe na cabeça das pessoas quanto às relações entre liberdade de expressão e privacidade. Além, é claro, da boa e velha imprensa achando que pode tudo.
Antes que me chamem de bushista ou sei lá o quê, aviso logo que discordo de boa parte das políticas de Bush e, se eu fosse americano, não votaria nele. A mesma coisa digo de Cheney. (Triste ter que dar avisos como esse para que as pessoas pelo menos leiam o que você escreveu antes de atirar pedras.) Na verdade, o caso só me interessou por ser mais um exemplo de como imprensa e loucura coletiva se alimentam mutuamente.
Quando existe um ligação real ou pelo menos um nexo de causalidade, é natural que nos preocupemos com os outros. Só que, quando falamos de pessoas públicas, o que vemos é uma preocupação patológica com a vida alheia.
Pessoas que não conseguem compreender o mundo senão pelo prisma afetivo-pessoal, desenvolvem amores e ódios por gente que nem conhecem. Elas não são capazes de dissociar o público do particular, a obra do artista ou as idéias do pensador. Assim, passam a ter uma curiosidade infundada sobre a vida particular do outro, sendo emocionalmente afetadas pelo que ocorre com a personalidade em questão. A intensidade desse fenômeno vai apenas determinar se o sujeito é um idiota (a maioria), um desocupado carente ou até um perseguidor assassino.
Tomando o caso Cheney como exemplo, vemos que ele é um político. Ou seja, a única coisa que pode, com razão, despertar interesse nas pessoas, são suas idéias e ações político-administrativas. Mas não, as pessoas querem saber o que acontece quando ele não está trabalhando. Chegam a sentir um interesse mórbido em explorar um acidente. - Cobram! - que ele dê explicações para a imprensa. Pior, exigem explicações até da Casa Branca.
Ora, ninguém deve nenhuma explicação à imprensa ou ao povo sobre um evento como aquele. Cheney não tinha que chamar a imprensa, nem dar satisfações pra ninguém além da família da vítima. O fato dele ser um homem público não muda a natureza particular do evento. Da mesma forma que ninguém tem nada a ver com um acidente envolvendo um cidadão comum, ninguém tem nada a ver com um evento particular na vida de um homem público.
Ele só poderia ter sido recriminado se não tivesse prestado socorro à vítima (o que não ocorreu) ou por impedir o trabalho da polícia. Notem que falei em impedir, pois nem a comunicar o fato para a polícia ele é obrigado. Não conheço a lei do Texas, mas a obrigação de chamar a polícia nesses casos, nunca é dos envolvidos. Aliás, não se exige isso do cidadão. Apenas hospitais, bombeiros, et cetera, tem o dever funcional de comunicar à polícia acidentes com armas de fogo.
Dessa forma, além de curiosidade patológica e morbidez pura e simples, esses casos revelam a confusão que existe na cabeça das pessoas quanto às relações entre liberdade de expressão e privacidade. Além, é claro, da boa e velha imprensa achando que pode tudo.
1 Comments:
Roger, cobrar lucidez e imparcialidade da grande imprensa é acreditar no papai noel, no bush e no lula(esse mesmo qaue não sabia de nada). A praxe da imprensa em geral é sangue,no caso exposto p/vc está mais que claro que foi acidente, houve socorro e a vítima já "perdoou", mas p/ a Mídia isso não importa.
abraço
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