quarta-feira, março 01, 2006

Gentileza Com o Chapéu dos Outros

Celso Amorim quer entrar na brincadeira de cobrar U$ 2,00 extras na venda de passagens aéreas internacionais. Tudo em prol de um fundo internacional de combate à pobreza mundial. Parece que doze países pretendem adotar a idéia apresentada pela França.

Cada dia me impressiona mais a falta de vergonha na cara dessa gente. Vão cobrar U$ 2,00 extras com base em quê?

Sim, porque tributo é gênero, cujas espécies, esgotando-se toda possibilidade imaginativa, são: impostos, taxas, tarifas, contribuições de melhoria, contribuições sociais e empréstimos compulsórios. Já a cobrança em questão não se encaixa em nenhuma espécie tributária existente.

Impostos são valores cobrados sobre um fato gerador qualquer, como o imposto de renda, cujo resultado deve ir para o caixa geral da União, sendo utilizado para cobrir as despesas do Estado.

Taxas se referem à contra-prestação paga pelo contribuinte por um serviço prestado ou colocado à sua disposição de forma compulsória, como taxa de esgoto.

Tarifa é o preço pago por um serviço opcional que o contribuinte efetivamente utilizou, como telefone.

Contribuição de melhoria é quando você paga por um serviço de infra-estrutura que te beneficiou diretamente, como o asfaltamento da sua rua, por exemplo.

Contribuições Sociais englobam diversos valores, desde as contribuições sindicais (caráter parafiscal), até os valores pagos para manter a previdência, saúde, etc.

Já empréstimo compulsório é uma aberraçãozinha inventada no Brasil, segundo a qual o cidadão é obrigado a emprestar dinheiro ao Estado. Em casos de calamidade pública ou guerra, até dá pra engolir essa. Só que também é possível o empréstimo compulsório para atender a investimento público urgente e de relevante interesse nacional. Sarney que o diga...

Como deu pra notar pelas definições acima, todo tributo deve obrigatoriamente ser revertido em algum benefício para o contribuinte. Até os impostos, que não têm destinação específica, devem ser utilizados para suprir despesas do Estado, como educação, estradas, pagamento de funcionários, manutenção do exército, etc.

Então, volto a perguntar: Com base em que pretendem cobrar U$ 2,00 na compra de passagens aéreas? Qual o benefício, direto ou indireto, que o contribuinte irá receber em troca? Com que direito pretendem nos fazer contribuir obrigatoriamente para o combate à pobreza mundial?

Trocando em miúdos, a medida é inconstitucional, já que ultrapassa o permitido pela Carta Magna. É juridicamente absurda, por inventar uma nova espécie de tributo sem qualquer relação com benefícios ao contribuinte ou despesas do Estado. E prejudica a economia, por interferir nocivamente nas relações de mercado.

Mas, principalmente, é imoral, por fazer gentileza com o chapéu dos outros.

Update

Cometi um erro no 4º parágrafo. Usei a venda de mercadorias como exemplo de fato gerador de imposto e, logo adiante, disse que o resultado iria para a União. No Brasil, a circulação de mercadorias gera um imposto estadual (ICMS) e não federal. Infelizmente só percebi o erro hoje (07/03/06). O texto já foi corrigido e a venda de mercadorias substituída pelo imposto de renda, este sim federal.